domingo, 16 de outubro de 2011

Os Reis da Pelada ou A Vida É Só Um Passeio de Elevador (2)

É estranho perceber que eu, um cara completamente resistente a novas tecnologias, não tenho nem celular, redescubra através do facebook lembranças fantásticas de infância. Aliás é coisa demais pra relatar num  blog, mas depois dos contatos com Jomar e Nivaldo, amigos de infância, minha mente não para de recordar.
Continuando o primeiro texto,  lembro que após a fase do futebol veio a da música. Quase todo mundo tocava alguma coisa no violão.
Algumas coisas intermediárias aconteceram também.
Teve a época do carrinho de rolimã. Não sei quem inventou, mas havia carrinhos sofisticados com volante, buzina, etc..Tinha até o trenzinho yuki, que era um carrinho de rolimã com 3 ou 4 bancos. Nunca vi nada igual em outras ruas. Tivemos também o skate. Fomos os pioneiros na Tijuca. Meu irmão viu um filme americano, e, muito criativo, resolveu fazer um. Pegou um pé de patins velho, tirou as rodas e fixou numa pequena madeira recortada. Achei fantástico! Ensinou-me a fazer e ficamos os dois descendo a Carlos Vasconcelos, que é uma ladeira suave. A garotada viu e em poucos dias todos fizeram seus skates. Só anos depois chegaram os skates industrializados. Realmente fomos os pioneiros. E sempre houve a época das pipas, em que o Henrique e o Luís Pardal eram os mais fanáticos.
Voltando à musica, muitos tocavam um pouco de violão. Cada um passava pro outro o pouco que sabia. Jomar e Bronko(hoje Bakari) tocavam alguma coisa, Sansão(nome verdadeiro) fazia barulho, Roberto Paulista e eu nos aperfeiçoamos um pouco mais. Mas muita gente sabia tocar pelo menos uma música.
Acabei me tornando compositor. Participei e ganhei ou me classifiquei bem em alguns festivais. Uma vez, numa festa junina de rua, o que era muito comum na época, um desconhecido tocou uma música minha ao microfone. Foi cercado pela galera que quis tomar satisfação. Disse que era meu amigo. Quando cheguei vieram me avisar e fomos falar com ele. O cara me abraçou como se fôssemos velhos amigos, o que não era verdade, mas fingi que era, ele estava muito assustado. Na verdade fiquei envaidecido de saber que um desconhecido sabia tocar e cantar uma música minha. Cheguei a dar show no teatro Opinião, um teatro de resistência na época, que o Nelson Motta divulgou na sua coluna no O Globo. Tenho o jornal até hoje.
Ficávamos reunidos até de madrugada em frente à vila do Sansão e da casa da Dona Odete, que tinha um auto-escola na sala da frente. Numa data comemorativa, talvez reveillon, Dona Odete nos deu uma garrafa de Chateau Duvalier, acho que rascante. Detestamos e imediatamente criamos uma musiquinha: " o chateau duvalier quem bebe vai morrer, o chateau duvalier quem bebe vai morrer". Cantamos e dançamos na sua janela , ríamos muito e ela ficou muito sem graça.
Acampávamos muito, o que normalmente era agitado pelo Bronko. Tudo era muito pouco programado, mas sempre dava certo. Alguém descobriu uma praia deserta, a Praia do Sol, nome que nós demos, porque o verdadeiro não sei até hoje. É uma pequena praia entre Piratininga e Camboinhas. Na época era de difícil acesso. Subíamos e descíamos uma encosta  com um paraquedas enorme. Valia a pena. Chegamos a comer macarrão com areia  lavado na água salgada. Ficou um horror. Um horror também foi quando o Ademir viu uma maria farinha subindo pela parte de fora do paraquedas. Gritou tanto que todo mundo(no paraquedas cabiam mais de dez) acordou assustado pensando que o mundo estivesse acabando ou fosse um tsunami. Nesse dia havia um outro grupo acampado, que assustado veio armado nos ajudar.
Aliás o Ademir era uma figura pitoresca. Não era líder, nem rico, nem o mais inteligente, não jogava bola, não tocava violão, era absolutamente um cara normal, mas era muito querido. Ele e o Josias, irmão do Jomar, eram possivelmente, os mais queridos. O Josias ainda jogava bola, razoável na linha e excelente no gol. Também poderia ter se profissionalizado como goleiro. O dois tinham como características básicas a simplicidade, o bom humor e a alegria, o que os tornava ótimas companhias. Não lembro de tê-los visto irritados ou discutindo por qualquer coisa. Na Copa de 70, depois do 3x1 do Brasil no Uruguai, a turma comemorando em cima de um carro em movimento, sofreu um pequeno acidente e o Ademir caiu de cabeça no asfalto. A comoção foi geral. Foi hospitalizado e preocupou a todos, pois levou algum tempo para se recuperar. Sua alegria e bom humor faziam falta. O cabeça dura acabou voltando ao normal(ou quase), só não lembrou mais do jogo.
Muita coisa interessante que aconteceu e muitas pessoas importantes, como Dona Edir por exemplo, não foram citadas aqui, mas tenho que encerrar. Não sem falar do trio que Sansão, Bronko e eu formamos. No final da adolescência éramos inseparáveis, de uma amizade e lealdade impressionantes. Quando saíamos passávamos o dinheiro dos três só para um. Na hora de pagar a conta quem estava com todo o dinheiro fazia pose e insistia em pagar. Viajei com o Bronko para a Argentina, ele voltou em 15 dias e eu fiquei 45. Estávamos acostumados a nos separar no meio dos projetos, éramos muito diferentes, o que nunca abalou nossa amizade. Ao voltar da Argentina só para trancar a faculdade, comecei um namoro relâmpago com a irmã do Sansão, que era praticamente noiva, e casei em 5 meses. Bronko e Sansão também casaram da mesma maneira e na mesma época.
A vida mudou completamente.
Casei adolescescente, 19 anos, 1,72m, pesando 50kg. Era um menino. Passei a viver a vida de outra maneira. Hoje depois de dois casamentos e três filhos, estou recomeçando. E eu que nunca acreditei em nada, ex-ateu convicto, agora como bom capricorniano, retomando a viagem, muito mais leve, volto ao violão, à poesia, ao esporte e, espero, a um novo casamento e novos filhos. Quando me perguntam a idade digo que tenho três: 40, 30 e 20.  40 anos quando estou vestido normalmente, 30 na praia, porque sou sarado, e 20 pelado, por causa da disposição.
Viva a vida bem vivida!!!

2 comentários:

  1. Cezar, a praia em Niterói que vc menciona aqui não seria Camboinhas?! Continue escrevendo. Eu e meu filho, o Dudu, aguardamos anciosos....! bjs

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  2. Adorei as suas histórias. Realmente o facebook trás a tona sentimentos e emoções passadas e o considero de bom uso por trazer amigos antigos de volta. Obrigada pelos comentários no meu blog, sempre me colocam pra cima!

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